Nosso Jornalzinho

Conforme eu já disse, procurávamos sempre algum meio de divertirmos. Quiquinha, que vivia inventando modas teve a ideia de arranjarmos um jornalzinho para mexer com o pessoal. A ideia foi executada e foi posto o título do jornal: "O Nariz". Redator: "Chuva aqui Chuva acolá". Colaboradores: diversos. O jornalzinho era terrível, mexia com Deus e todo o mundo... a começar pelo pessoal de casa. Arranjamos um meio do jornal chegar na Agência do Correio sem ninguem saber da procedência.
Foi lembrado o estafeta de nome Nonoca que sempre parava lá em nossa casa e tomava café antes de ir para a Agência. Quiquinha, maneirasamente, combinou com ele, pedindo reserva, para colocar o jornal junto com a guia da correspondencia. Nonoca prontificou-se, e assim o jornal circulou algumas vezes.
Quando o jorna aparecia, era um verdadeiro rebuliço: todo o mundo queria ler, e muita gente ficava zangada com as críticas mordazes. Para despistar, pedíamos emprestado o jornal que era lido quase sempre na porta do negócio. Em virtudo das críticas cada vez mais fortes, os animos ficaram exaltados e o Agente do Correio resolveu não fazer entrega do jornalzinho, caso aparecesse de novo.
Com esta ameaça não desanimamos e procuramos outro meio do jornal circular. Numa Semana Santa comemorada com muito entusiasmo, com aglomerado de gente de toda parte, pensamos em escrever outro jornalzinho. Mas a principal redatora do jornal, que era a Quiquinha, estava assoberbada de serviços na Igreja, arranjando altares, calvário, além da cantoria. Incumbimos o Juca Sette, que era nosso hóspede, de fazer o jornal. Pois bem; o jornal saiu melhor do que a encomenda. As críticas eram ferinas. No artigo de fundo nem o Vigário foi poupado. Sio Sete, nosso vizinho, foi barbaramente castigado. Ele tinha a alcunha de Sete Pinga. O que fez o Juca? Desenhou um pipote com uma torneira pingando e em cima colocou um 7 de todo tamanho. Outra crítica ao mesmo Sete: como ele era dentista prático, surgiu no jornal a seguinte crítica: "Cúmulo da arte dentária: Sete Pinga colocar dentadura na boca da noite." Sia Benta, esposa do Sete, danou os pregos e disse alto para ser ouvida por todos: "É a noite chegar com a boca que ele põe mesmo."
Com os animos exaltados não era possível continuar com a brincadeira provocante e assim ficou encerrada a circulação do "O Nariz".
Mais tarde arranjamos outros jornais com críticas moderadas. Um deles tinha como título "A Pendula" - título que encerrava uma crítica ao andar balanceado do Professor Raimundo Nonato Ramos.
Em Rio Doce - onde passamos uns tempos - arranjamos outro que fez sucesso, denominado "O Serra Côco", cujo nome era uma crítica ao Vigário, que era italiano, e do pulpito queria censurar aos moços e moças referindo-se ao namora, dizia: "Estas moças que vem a Igreja só para serrar côco com os rapazes..." e por aí afora... O Serra Côco era mais moderado e por esta circunstância teve maior duração. Quiquinha já estava casada, por esta razão não fazia parte da redação. Eu escrevia os artigos e críticas e Zinha era a tipografia. Só desta forma ela fazia parte da redação pois não gostava de criticar.

Belo escorregão

Maria Bonifácia foi, por assim dizer, criada com a família de Sia Clara da Cruz.